domingo, 9 de agosto de 2009

Javé Nossa Justiça: o elogio da ignorância

Javé Nossa Justiça: o elogio da ignorância

Causa preocupação às pessoas interessadas pela democracia, o lançamento, no Recife, de um movimento evangélico e supostamente ecumênico, chamado Javé Nossa Justiça. Esse grupo articula uma campanha de combate direto ao aborto e ao homossexualismo. Ora, quanto ao aborto, trata-se de um tema muito polêmico e que, normalmente envolve interpretações em relação ao início da vida, em relação ao status de pessoa do embrião, etc. É um debate sobre o direito de se vir ou não ao mundo.

Inadmissível, contudo, é o ataque frontal e contundente à opção sexual das pessoas que vivem nesse mundo; em outras palavras, isso significa discriminar os seres humanos que já viveram, vivem ou viverão sobre o planeta Terra simplesmente porque eles têm uma preferência sexual distinta da nossa. É exatamente isso que faz o tal movimento “ecumênico”!
Pior ainda: “evangélicos” invocarem Cristo para achincalhar a dignidade alheia e insultar as escolhas sexuais das outras pessoas é uma enorme ofensa à conduta do Nazareno. Os Evangelhos estão repletos de Seus exemplos de tolerância e de repúdio à hipocrisia.

Kant, já no século XVIII, estabeleceu o conceito de dignidade humana, apontando para o fato de que cada pessoa tem um valor intrínseco, que cada uma é um fim em si mesmo e que jamais poderá ser tratada como um meio. O movimento Javé Nossa Justiça usa o ataque aos homossexuais como um meio para obter visibilidade pública e convencer os incautos de que as suas teses mal-elaboradas e inconsistentes têm algum valor ético.

Mentem quando afirmam que a OMS declarou o homossexualismo uma doença, e omitem o fato de que no Brasil, por exemplo, o Conselho Federal de Psicologia censurou publicamente a psicóloga carioca Rozângela Alves Justino por prometer a cura do homossexualismo para seus possíveis pacientes.

Não é possível que, numa sociedade civilizada, alguém venha publicamente propagar e incentivar a desvantagem de qualquer minoria, seja ela racial, sexual, econômica, lingüística, etc. Isso é o que se chama de “discriminação de primeiro grau”, na qual prega-se que determinadas pessoas são inferiores ou diferentes e por tal motivo devem ser afastadas das oportunidades de educação e de emprego. Hitler fez isso na Alemanha!

Pior ainda: esses “religiosos” querem negar ao homossexual o direito à união afetiva, tornando-os cidadãos de segunda classe. Toda essa intolerância é expressamente vedada pela Constituição do Brasil. Ela garante a igualdade tanto como identidade quanto como diferença. A igualdade como diferença significa que ninguém é obrigado a professar os valores dos grupos dominantes como pré-condição para ser tratado de modo equitativo. Faz parte da auto-estima e da busca pela felicidade de alguém o fato de poder ser reconhecido como se é e não como os outros prescrevem

Os mentores desse movimento antidemocrático e absurdo, ao esquecerem que o Estado brasileiro é laico, esquecem também que cabe ao Estado a responsabilidade de tratar, como igualmente importante, o destino de todo e qualquer cada cidadão. Deles pode-se dizer o mesmo que Millôr Fernandes disse de Ibrahim Sued, colunista social de O Globo à época da ditadura: “sempre defendeu, com grande ignorância, a ignorância”.

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